O poder duradouro do Charlatão

O poder duradouro do Charlatão

Claus Leggewie

LARB – Los Angeles Review of Books – 11 de Fevereiro de 2022

EM 16 DE OUTUBRO DE 1937, uma certa Grete de Francesco, de Milão, enviou uma carta manuscrita de 12 páginas ao “estimado Sr. Thomas Mann”, juntamente com um exemplar do seu livro recém-publicado, Die Macht des Charlatans (O poder dos charlatães). Embora desconhecida para o autor mundialmente famoso, Francesco insistiu que Mann era o “santo padroeiro dos intelectuais” por detrás de seu próprio trabalho: “Este livro nunca teria sido escrito”, explicou ela, “se não fosse pelo alerta” fornecido em 1930 em seu livro Mario e o magico[1].

Como mostram os seus diversos sublinhados, Mann leu a carta com atenção e até atendeu o pedido de Francesco, de recomendar que sua obra fosse resenhada em um periódico de destaque. O livro obteve ainda mais sucesso nos Estados Unidos depois de ter sido lançado pela Yale University Press em 1939 (em uma tradução de Miriam Beard), eventualmente tornando-se conhecido entre os escritores exilados bem como na Alemanha de Hitler, onde as autoridades reconheceram o seu potencial explosivo e prontamente destruíram o maior número de cópias que conseguiram. Desde então, a obra de Grete de Francesco foi amplamente esquecida – até que, em 2021, a editora alemã Die Andere Bibliothek lançou uma reimpressão brilhantemente comentada.  

Neste ensaio, eu reflito sobre a atualidade desse relançamento. Antes, entretanto, alguns fatos básicos sobre a autora do livro. Ela nasceu em Viena em 1893, sendo que o seu nome de registro era Margarethe Weissenstein. Estudou história da arte em Munique; casou-se com um engenheiro, Giulio de Francesco, com quem viveu em Milão e, mais tarde, em Berlim. Em 1931, Francesco se tornou a primeira mulher a se formar na progressiva Academia Alemã de Política, com uma tese intitulada “A Face do Fascismo Italiano”. Trabalhando como escritora e jornalista, ela costumava fugir da perseguição mudando-se constantemente: de Viena a Praga, Paris, Basileia, Zurique e Milão. Após esta última cidade ser sido ocupada pelos alemães em 1943, e pelas SS em outubro de 1944, Francesco foi presa. Dois meses depois, ela foi transportada para o campo de concentração de mulheres em Ravensbrück, onde presumivelmente foi morta pouco depois, tornando-se vítima do maior de todos os charlatães, Adolf Hitler.

O livro de Francesco é um fascinante exame histórico da figura do charlatão, a qual permanece válida. Baseando-se em uma variedade de fontes históricas, Francesco traça este caminho através da Europa moderna, quando a figura do charlatão habitou em alquimistas, curandeiros, mesmerizadores, adivinhos e espertalhões. Os indivíduos que fazem uma aparição no livro incluem fabricantes de ouro há muito esquecidos, como Leopold Thurneißer e Marco Bragadino, e ocultistas como o Conde Alessandro di Cagliostro. Francesco, que às vezes aparenta ser uma socióloga da linha da fenomenológica de Walter Benjamin ou de Siegfried Kracauer, ao invés de uma historiadora da arte, consegue destilar os traços e comportamentos de todas essas figuras históricas em um arquétipo. [1]

Conforme acima mencionado, o livro de Mann foi interpretado de maneira muito diferente – pelos seus leitores, por filólogos profissionais e até pelo próprio Mann. Por exemplo, por acaso a figura do ‘mago’ na narrativa representaria uma alusão direta aos demagogos fascistas da época, Mussolini e Hitler, ou, estaria lidando com mais um Künstlerroman (romance de arte), como em seu outro livro Tonio Kröger[1] (1903)? Ou por acaso a narrativa simplesmente monta a uma incursão ao reino do oculto, que tanto fascinou Mann durante a década de 1920? Por Acaso estaria ele lutando com a sua homossexualidade enrustida? Ou simplesmente ele desejava encantar os seus leitores descrevendo a “trágica experiência de viagem” de uma família alemã, conforme sugerido no subtítulo original do livro? O início da narrativa faz parecer assim, mas apenas se ignorarmos o prenúncio no primeiro parágrafo de um “final horrível”. No entanto, os sinais da incursão furtiva do fascismo eram inconfundíveis:

Havia brigas por bandeiras, disputas sobre autoridade e precedência. Os adultos se juntaram, não tanto para pacificar, mas para julgar e enunciar princípios. Frases foram lançadas sobre a grandeza e a dignidade da Itália, frases solenes que estragaram a diversão. Nós vimos a retirada dos nossos dois pequeninos, confusos e magoados, e foi proposto que a situação fosse explicada. Essas pessoas, nós dissemos a eles, estavam apenas passando por um certo estágio, por algo tipo uma possível doença; não muito agradável, mas provavelmente inevitável.

As narrativas continuam chegando até que, após mais ou menos 10 páginas do livro, o mago titular finalmente faz a sua entrada. ‘Cavaliere Cipolla’ (Dom Cebola), animador “impulsionador, ilusionista, conjurador”, conforme ele próprio se descreve; trata-se de uma figura repulsiva, com um corpo deformado que mesmeriza o seu público, os coloca em transe, e os engana e humilha. “Você certamente perguntará”, o narrador se dirige ao leitor, “por que nós não escolhemos este momento para ir embora – e eu devo continuar devendo-os uma resposta. Eu não sei porque. Eu não consigo me defender”.

É nesse clima de passividade coletiva que Mario – um garçom de café conhecido da família do narrador, que havia acompanhado os procedimentos “de braços cruzados, ou então com as mãos enfiadas nos bolsos do casaco” – é chamado ao palco: “’Beije-me!’, disse o corcunda. Confie em mim, eu te amo. Beije-me aqui”. E com a mão, braço e dedo mindinho estendidos, com o dedo indicador ele apontou para a bochecha, bem perto da boca. E Mario se curvou e o beijou.”

Infelizmente, desta vez o mágico foi longe demais: o humilhado Mario atira em Cipolla e, na “comoção indescritível” que se segue, os turistas alemães saem às pressas da cena do crime, com as crianças perguntando se aquilo significava o fim do show de mágica. “Sim, nos garantimos a eles, esse foi o fim”, diz o narrador. “Um fim de horror, um fim fatal. E, no entanto, uma libertação – pois eu não poderia, e não posso, mas acho que sim!” Um assassinato ao estilo deus ex machina (o deus da máquina; a providência divina), como o catalisador de uma virada para melhor?

Em seu estudo da figura do charlatão, Francesco cuidadosamente evitou tirar conclusões para o seu próprio tempo. E, no entanto, as suas observações sobre a natureza e os mecanismos do charlatanismo são valiosas não apenas para a era do fascismo, mas também para o início do século XXI.

O charlatão — ou o fingidor, como possivelmente diríamos — é mais astuto do que inteligente, e, possui um conhecimento superficial. Ele não imita; ele distorce, inclusive a realidade, por meio de suas falsidades. Ele confia na ciência como espelho e antagonista, pervertendo todas as evidências empíricas e as sofisticações teóricas, e caricaturando-a através do uso de terminologia mal compreendida. Os charlatães não formam uma profissão unificada: você os encontrará em todas as classes e linhas de trabalho; o que importa é a orientação para seu próprio ganho. Enquanto que o pedante considera seriamente cada detalhe, o charlatão está bem ciente da trivialidade daquilo que ele prega; o primeiro engana-se a si próprio, e o ultimo aos outros. Assim, o charlatão não é nada sem seguidores, um grupo de adeptos formado principalmente por indivíduos fracos e decepcionados que ele ojeriza e despreza – eles querem ser enganados, afinal, especialmente em tempos de crise e turbulência.

O charlatão está relacionado com o impostor, o alquimista, o vidente e o mago; no entanto, enquanto estes se dedicam ao negócio da transformação, a arte do charlatanismo limita-se a fazer promessas impossíveis de cumprir. Nenhuma falsificação científica, nenhum decreto político deterá o charlatão ou deterá a multidão de olhos arregalados. Seu único oponente real é o indivíduo cético, ou seja, aquilo que Francesco chama de “a pequena minoria de homens e mulheres incorruptíveis que viviam, desconhecidos e até evitados, entre o rebanho de ‘crentes’, como se fossem portadores de uma infecção”.  Sem dúvida ele pensava em Hitler, quando concluiu seu estudo afirmando que “foram esses indivíduos solitários” que sempre foram “chamados para liderar a luta contra o poder do charlatão”.

Na época da publicação de Mario e o magico, Mann havia descartado qualquer interpretação estritamente política de sua alegoria, embora a narrativa se passe muito claramente na Itália de Mussolini, com grande parte da população cheia de entusiasmo nacionalista. Mas depois que Hitler foi feito chanceler, e especialmente à luz de seu belicismo, Mann passou a ver sua novela de forma diferente, observando em sua palestra de 1940 “On Myself” (Sobre Eu): A alusão moral-política, nunca diretamente afirmada, foi então muito bem entendida muito antes de 1933 na Alemanha: entendida com simpatia ou aborrecimento! — a advertência sobre a violação ditatorial, superada e aniquilada na libertadora catástrofe humana da conclusão.” Um ano depois, ele escreveu ao pioneiro do rádio Hans Flesch: “Só posso dizer que vai longe demais ver em Cipolla simplesmente uma máscara de Mussolini. Então, novamente, é claro que a novela tem um claro significado moral-político.” [2]

O “aviso sobre violação ditatorial” é tão oportuno agora quanto foi em 1930 – e não devemos esperar por outro “1940” antes de levá-lo a sério. Os charlatães menores abundam hoje, como recentemente ficou evidente, por exemplo, nos charlatães que promovem curas falsas do COVID-19 em oposição à vacinação. Em muitos países, tais dissidentes autodenominados dissidentes ou Pensadores Laterais (em inglês Mavericks; em alemão Querdenker) surgiram, trabalhando em frenesi devido à sua convicção de que são vítimas de uma grande conspiração instigada pelo governo, pelo capitalismo global ou pelos judeus (ou por todos esses combinados). Assim como seus antepassados históricos, tão vividamente descritos por Francesco, os charlatães do tipo do Cipolla (Cebola) hoje empregam argumentos pseudocientíficos para mobilizar um grande número de seguidores, gerando uma destrutividade comparável à dos fascistas nas décadas de 1920 e 1930.

Em 1949, o sociólogo Leo Löwenthal e o psicólogo Norbert Guterman — que como Mann, eram membros da comunidade de expatriados da Califórnia, nos Estados Unidos — publicaram um estudo intitulado Prophets of Deceit: A Study of the Techniques of the American Agitator (Os profetas da artimanha: um estudo das técnicas do agitador americano). O livro de Löwenthal e Guterman lida com figuras como o fascista nascido nos Estados Unidos William Dudley Pelley, ou os ativistas de direita Elizabeth Dilling e Joseph P. Kamp, todos eles sendo antissemitas fervorosos, anticomunistas e contrários ao New Deal de Roosevelt. De Huey Long a George Wallace e a Donald Trump, podemos traçar uma longa linhagem na genealogia do charlatão americano.

O livro Prophets of Deceit (Os profetas da artimanha) examina a atração do autoritarismo de meados do século, a disposição do público de massa de se subordinar a uma figura líder, bem como a acreditar em teorias da conspiração e a desprezar as elites e os intelectuais liberais. O adepto, escrevem seus autores, “continua sendo um azarão frustrado, e tudo o que o agitador (ou militante) faz é mobilizar os seus impulsos agressivos contra o inimigo. […] Assim, a imagem do adepto serve indiretamente para condicionar o público à disciplina autoritária.” Para o agitador, o adepto pularia da Trump Tower, ou no mínimo perdoaria o seu herói por atirar em alguém na Quinta Avenida.

Hoje em dia, a questão crucial é como a sociedade civil lida com o fascismo passado e futuro, a que distância será capaz de se manter – ética e estrategicamente – digamos, do supremacismo branco e do antissemitismo. Recordemos o narrador de Mann e sua pergunta: “Por que não escolhemos este momento para ir embora?” Em outras palavras, por que não reunimos o mesmo espírito de resistência de Mario ou, de preferência, um tipo de oposição mais civilmente engajada? As analogias com a situação de hoje – o surgimento de novas autocracias, a onipresença de teorias da conspiração, a desconfiança generalizada dos governos e das elites – não podem ser enfatizadas o suficiente.

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Claus Leggewie é um cientista político que leciona na Universidade de Giessen (Alemanha), onde ocupa a cátedra Ludwig Boerne. Em 2021, foi membro honorário da Casa de Thomas Mann, em Pacific Palisades, na California. Ele lecionou Estudos Europeus na Universidade de Nova York e recebeu o Prêmio Sander por contribuições notáveis ​​para a relação acadêmica entre o mundo de língua alemã e os Estados Unidos. Ele está particularmente interessado em como parar a regressão democrática das sociedades liberais.

[1] Etimologicamente, charlatão(em italiano, ciarlatano), é derivado de ciarlare (falar). Na Itália medieval, a aldeia de Cerreto di Spoleto, na Úmbria, tinha a fama de ter gerado um número especialmente alto desses charlatões. O dicionário Merriam-Webster define o charlatão como “aquele que apresenta pretensões geralmente vistosas de conhecimento ou habilidade” e lista esses termos como sinônimos: “falso, falsário, faquir, fraudador, embusteiro, farsante, impostor […], falso, fingidor […], impostor, boateiro, aliciador, dissimulado.”

[2] Ver Nicholas Martin, “Thomas Mann’s Mario und der Zauberer: ‘Simply a Story of Human Affairs’”, em The Text and Its Context, ed. Nigel Harris e Joanne Sayer (Frankfurt: Lang, 2008), 168.


[1] Veja mais aqui (NT).

[2] Leia o ensaio literário Carlos Russo Jr. No Jornal Opção (NT).

Arthur Howe, Jr. (1921-2014)

Se você é um ex-bolsista AFS, como eu (1970-71, West Hartford, Connecticut), certamente se lembrará do nome Arthur Howe, Jr., o “Mr. Howe”, como era referido pelos membros do Comitê do AFS no Brasil. Encontrei o Obituário do “Mr. Howe” por acaso, depois de ter pesquisado o nome do jornalista americano Irving Howe, na internet, após ler um artigo deste na The New York Review. A seguir, uma amostra do obituário do “Mr. Howe” Source: https://rwwfh.com/tribute/details/119/Arthur-Howe/obituary.html

Após a Segunda Guerra Mundial, o Sr. Howe foi voluntário para a AFS e foi fundamental na evolução da organização para o programa de intercâmbio internacional de estudantes que é hoje. Em 1949, ele começou a trabalhar em seu Conselho de Administração e, em 1952, tornou-se vice-presidente voluntário. Em 1965, ele assumiu o cargo de presidente contratado. Nos sete anos seguintes, ele trouxe maior profissionalismo e estabilidade de operações para a organização e supervisionou sua expansão, resultando em cerca de 13.000 intercâmbios de alunos em 60 países a cada ano.

Obituary of Arthur Howe, Jr.

Arthur Howe, Jr., aged 93, passed away peacefully on December 16, 2014, at his home in Essex, CT, following a brief illness. His devoted wife of 70 years, Margaret (“Peggy”) Burke Howe, plus many other family members, were at his bedside providing loving care and attention during the preceding weeks. He is also survived by his four children, Margie Emmons, of Yarmouth, ME, Sam Howe, of Andover, MA, Arthur Howe, III, of Ipswich, MA, and Tom Howe, of Gilmanton, NH, by his brother, Richard Howe, of Gardiner, WA, by ten grandchildren, and by five great-grandchildren. Three of his siblings, Alice Austin, Harold Howe, II, and Sydney Howe, predeceased him, as did his second daughter, Louise Howe, who died in 1954 at the age of two. He devoted his life to his family, advocating for world peace, educational opportunity, social and economic justice, and service to others, and enjoying the outdoors, all in keeping with values held dear by his forebears. He felt privileged for all the people, places, and activities he enjoyed during his full life, and remained especially grateful to his ancestors for all that they made possible for him. Armed with a powerful intellect, broad experience, passion for service, and tireless pen, Mr. Howe was a relentless agent of change. Mr. Howe was born on July 19, 1921, in Watertown, CT, one of five children of Margaret Armstrong Howe and Arthur Howe. He spent some of his childhood years in Hampton, VA, where his father had become President of what is now called Hampton University. That institution was founded in 1868 by Mr. Howe’s maternal grandfather, Gen. Samuel Chapman Armstrong, who led African American troops during the Civil War and then founded the Hampton Normal and Agricultural Institute to provide vocational and educational opportunities for African and Native Americans. Mr. Howe’s childhood exposure to racism and segregation laws while in Virginia shaped significantly his later, life’s work promoting equal educational opportunities especially across racial lines. Mr. Howe attended the Hotchkiss School (Class of 1938), spent a post-graduate year at The Rugby School, in England, and earned a B.A. in Education from Yale University (Class of 1943, with actual degree earned in 1947). Hampton Institute awarded him an honorary Doctorate of Humane Letters in 1965.

During World War II, he served with the American Field Service (AFS), a field ambulance corps, rising to the rank of Major in the British 8th Army by the age of 22. Subsequently, King George VI awarded him the Order of the British Empire (OBE) for his “unusual skill and devotion to duty.” Mr. Howe taught at the Hotchkiss School during the late 1940’s, and in 1969 earned the school’s highest honor, the Alumni Award, given annually in recognition of outstanding service to others. Decades earlier, his father had received the same award. In 1951, Mr. Howe accepted a job at Yale in admissions and scholarship programs. By 1956, he had become Yale’s Dean of Admissions and Student Appointments. In that role, he downplayed reliance on SAT scores and grades and increased the school’s use of other information indicative of an applicant’s character and potential, such as input from trusted college placement advisors. He diversified the student body racially, and was an early, controversial advocate, starting in 1956, for the admission of undergraduate women, who arrived 12 years later. He also initiated Yale’s Summer High School Program, an experimental project for educationally deprived high school students with exceptional potential.

Following World War II, Mr. Howe volunteered for AFS and was instrumental in the organization’s evolution into the international student exchange program that it is today. In 1949 he began service on its Board of Directors, and then in 1952 became its volunteer Vice-President. In 1965 he assumed the hired position as its President. For the next seven years, he brought greater professionalism and stability of operations to the organization, and oversaw its expansion resulting in some 13,000 student exchanges in 60 countries each year. Later, as a Life Trustee and volunteer, he helped gain U.S. Army veterans’ status for eligible AFS drivers, resulting in medical care and other benefits getting to needy drivers and their families. He saw AFS as a vehicle for enabling responsible global citizens to work for peace and understanding in a diverse world. Mr. Howe served on the Boards of many educational, religious, civic, and conservation organizations, including: Hampton Institute (including Chair of its Board), the Hotchkiss School, the Pomfret School, the Foote School, New England Association of Colleges and Secondary Schools, the College Entrance Examination Board, the Ford Foundation’s Fund for the Advancement of Education, the State of Connecticut’s Review and Evaluation Board for Connecticut Higher Education, The Institute of World Affairs, the Kate Macy Ladd Foundation, the Lyme and Essex [CT] Volunteer Fire Departments, the Lyme Zoning and Planning Commission, the Lyme Land Conservation Trust (including Presidency of its Board), the Lyme Congregational Church, the First Congregational Church of Ivoryton [CT], the Chocorua Island [Squam Lake, NH] Chapel Association (including Presidency of its Board), the CT Chapter of the Coastal Conservation Association, and Landmark Volunteers. He also brought his wisdom in race relations, education, and corporate responsibility to the Board rooms of the following corporations: the Riegel Textile Company, Riegel Paper Company, St. Joe Minerals Corporation, and Rexham Corporation. Of special note, he served for about four decades as a director, and 17 years as President, of Rockywold-Deephaven Camps, a family owned business on Squam Lake, NH, where he had deep family ties. There, he initiated key changes resulting in improved water quality of the Lake, reduction of high-speed boating, establishment of a pension plan for staff, and diversification of ownership of the corporation. One of his favorite traditions, over some 60 or so years, was joining the Camps’ maintenance crew each January in the harvesting of 3,400 cakes of ice from the Lake for later, summertime use, a practice which continues to this day. Squam Lake is where Mr. Howe first met his beloved wife 91 years ago, and remains their spirits’ home. Love of the outdoors was a lifelong pursuit. He especially enjoyed fishing and canoe trips with his wife, other family members, and friends. Flowing water was essential to his wellbeing. He became an expert fisherman in the Lower Connecticut River and Long Island Sound, loved to guide family and friends, and was locally famous for his smoked bluefish pate. Mr. Howe loved telling stories, and had a keen sense of humor [I removed the remaining text, about the funeral arrangements].

Source: https://rwwfh.com/tribute/details/119/Arthur-Howe/obituary.html

O hábito do auto aprimoramento e o hábito de seguir os outros

Jo Pires-O’Brien

Segundo Jordan B. Peterson, o psicólogo canadense e autor dos livros Maps of Meaning: The Architecture of Belief (Mapas de significado: a arquitetura da crença; 1999),  e 12 Rules for Life: An Antidote to Chaos (12 regras para a vida: um antídoto para o caos; 2018), as pessoas subdividem-se em dois grandes grupos. O primeiro grupo descreve as pessoas que pensam por si próprias e têm o hábito do auto aprimoramento. O segundo grupo descreve as pessoas que seguem os outros ao invés de pensar por si próprias, e, não têm o hábito do auto aprimoramento. Este segundo grupo de pessoas depende demasiadamente da aprovação de terceiros, e para ganhar tal aprovação, aceitam se transformar em um dente de engrenagem da sociedade. Devido ao sistema hierárquico das sociedades, muita gente pensa que apenas as pessoas que mandam ou que tomam as grandes decisões são responsáveis pela sua sociedade. O fato de um cidadão um mero dente de engrenagem não tira delas a responsabilidade pelo que a engrenagem inteira faz. A responsabilização social é para todos, incluindo os que seguem os outros e têm preguiça de pensar.

Jordan B. Peterson. Como um Estado totalitário é realmente formado

Jo Pires-O’Brien

As pessoas costumam ter ideias erradas acerca de como os Estados totalitários são formados, afirmou o psicólogo e intelectual público canadense Jordan Peterson numa palestra divulgada na YouTube. Segundo Peterson, os dois erros mais comuns são imaginar que o Estado totalitário consiste de um tirano maléfico e indivíduos oprimidos, e, que nele as catástrofes cascateiam de cima para baixo. Ele cita dois casos que provam o contrário disso, mostrados pelos autores Alexandre Solzhenitsyn e Christopher Browning.

Solzhenitsyn escreveu O arquipélago gulag onde registrou a realidade dos ‘gulags’ – plural do acrônimo do sistema de prisões da União Soviética, que eram verdadeiros campos de trabalho forçado, onde ele próprio esteve preso durante muitos anos em decorrência do conteúdo de uma carta particular interceptada.  Solzhenitsyn conta que durante o período que passou detido no gulag ele aproveitou para refletir sobre o que ele próprio havia feito que podia ser considerado conivente com o sistema, e que outras faltas teria cometido. Ele se lembrou que quando jovem ele havia apoiado sem questionar o Partido Comunista soviético, e reconheceu as coisas que fez no passado que foram verdadeiras traições à sua própria integridade moral.  A absoluta indignação de Solzhenitsyn salta das centenas de páginas de O arquipélago gulag, um livro terrível e enérgico, escrito com a esmagadora força moral da verdade sem verniz. O livro descreve os cruéis administradores dos gulags, que eram os próprios presos, mas não os políticos, e sim os que haviam cometido crimes de verdade.  Joseph Stalin não era o único tirano na União Soviética pois lá havia tirania em todos os níveis. Embora tivesse sido banido, por razões óbvias, o livro foi contrabandeado para o Ocidente nos anos 70 e acabou sendo traduzido para diversas línguas. Com esse livro Solzhenitsyn demoliu por completo a credibilidade intelectual do comunismo, como ideologia ou sociedade.

Browning escreveu o livro Holocaust, um estudo psicológico de 101 policiais nazistas alemães enviados para a Polônia em 1942 para aterrorizar os judeus como parte da missão da ‘solução final’ nazista.  Os psicólogos queriam entender como é que esses policiais, que eram pessoas ordinárias uma vez que não tinham sido doutrinados pela organização ‘Hitler Youth’, mas mesmo assim acabaram se tornando perpetradores do Holocausto.  O livro de Browning dá os pormenores da transformação psicológica dos policiais envolvidos. Tudo começa com um dos chefes explicando aos seus subordinados que eles terão que fazer coisas ruins, mas que, os que não quiserem fazer esse tipo de coisa, podiam voltar para casa. No entanto, o fato da força policial ser uma organização quase militar e fechada não era conducente à dissensão. O raciocínio mais natural nessas circunstâncias era: “Não vou deixar que meus colegas façam todo o trabalho sujo, pois isso seria covardia”.  Havia um elemento ético que mantinha o indivíduo lá, no fato de que a opção de ir para casa não seria percebida como um ato heroico. Assim sendo, os indivíduos se envolveram no esquema com facilidade. Entretanto, os requisitos para a permanência deles na organização policial continuaram aumentando. Cada instância em que um policial aceitava fazer uma coisa horrível, aumentava a probabilidade de ele também fazer o próximo ato ainda mais sórdido. Isso não significa que os policiais alemães não tivessem sofrido com a situação onde se encontravam, quer mental, quer  fisicamente, mas apesar disso eles não desistiram da missão. A conclusão do estudo foi de que qualquer pessoa comum pode ser atraída a fazer coisas tão horríveis.

Outra tirania importante do século XX era a da a Alemanha Oriental, na qual uma em cada três pessoas era informante do governo. Isso significa que numa família de seis pessoas havia duas em quem você não podia confiar. Assim, pensar que a tirania vem de cima para baixo na estrutura política social é um engano. Uma tirania é algo que existe em todos os lugares ao mesmo tempo; e é fácil as pessoas dizerem coisas como “eu estava apenas cumprindo ordens”.

Quando as pessoas aprendem acerca das tiranias do século XX é comum imaginarem que se elas estivessem vivendo numa situação similar elas não seriam perpetradores de crueldades. Quando as pessoas assistem filmes como A Lista de Schindler e outros desse tipo, a maior parte delas imagina-se que se estivessem no lugar e no tempo seriam os heróis e não os perpetradores de crimes e maldades. A pesquisa que existe acerca das personalidades humanas mostra que não seria assim. Uma boa parte dos culpados pelas grandes tiranias do século XX é composta pelos indivíduos ordinários.

Embora a palestra de Peterson tenha se concentrado nos Estados totalitários, ele reconhece que mesmo as democracias costumam perder o rumo e aprovar legislações de caráter antidemocrático e totalitarista, conforme aconteceu recentemente quando os parlamentares do Canadá aprovaram uma emenda à Lei de Direitos Humanos que obriga as pessoas a empregar os novos pronomes pessoais de gênero (PGPs) promovidos pelo ativismo LGBT, que insiste que os pronomes pessoais ordinários,  he (ele), she (ela), him (dele) e her (dela), são discriminatórios pelo fato de serem binários.  Dentre os novos pronomes pessoais não binários podemos citar: e/ey, em, eir, eirs, eirself, zie, \im, zir, zirs, zirself, etc.  Para Peterson, a nova lei infringe o direito pessoal de expressão e é totalmente desnecessária. Na ausência dessa legislação ele não tinha objeções a empregar os novos pronomes, caso achasse conveniente, mas agora que a lei obriga ele já não se sente disposto a usá-los.

Ainda mais vulneráveis que as democracias estáveis como o Canadá e os Estados Unidos são as democracias ainda em formação, que podem ser descritas pela fictícia Belíndia criada pelo economista e escritor brasileiro Edmar Bacha no ensaio “O economista e o rei da Belíngia: uma fábula para tecnocratas”.  A fictícia Belíndia de Bacha é uma metáfora para o Brasil, país formado por uma pequena porção rica, cercada pela enormidade de pobreza; é uma democracia, uma vez que nela não há nenhum grande tirano. Entretanto, possui centenas de pequenos tiranos, nos funcionários do governo, que fazem seus desmandos com impunidade.  Os funcionários corruptos eram honestos quando jovens, mas eventualmente se corromperam, passando por um processo semelhante àquele descrito no livro Holocaust de Browning, acima mencionado. Tudo começa com um pequeno deslize, como fazer vista grossa para algo errado. E assim como Browning desreveu a transformação de honestos funcionários alemães em assassinos, no regime da Belíndia, cada deslize cometido por um funcionário aumenta a probabilidade deste cometer o próximo.

Peterson conclui o seu argumento sobre como os estados totalitários são formados mostrando que a tirania é como uma erva daninha que pode florescer em todo lugar, desde as famílias e as organizações até os mais baixos escalões do governo. Todos os cidadãos são responsáveis pela sociedade.

A histografia da Assíria-Babilônia e a dos israelitas

Duas historiografias da antiguidade que são interessantes pelas suas interconexões são a da Assíria-Babilônia e a dos israelitas da Judeia.

A principal historiografia sobre a Babilônia e a Assíria disponível ao mundo grego é a obra de Beroso (Berosus), um padre caldeu do templo de Bel (Baal), que deixou a Babilônia logo depois da conquista por Alexandre o Grande, sendo datada em torno de 240 a.C. Depois de sair da Babilônia, Beroso foi morar na ilha de Cos, na Ásia Menor, onde montou um observatório e uma escola de astronomia. Beroso também passou um período em Atenas, onde era altamente estimado, ao ponto de uma estátua de cobre ter sido feita em sua homenagem. Beroso dedicou os seus três livros sobre a cultura da Babilônia, escritos em name the Jews have for the Biblegrego, a Antióquio I (c. 324–261 a.C.), monarca Síria selêucida, que reinou entre 292 e 281 a.C., no leste, e de 281 a 261 em todo o país.

Quando Beroso completou os seus três livros sobre a Babilônia e a Assíria, as escrituras em hebraico que eventualmente foram reunidas para formar os 24 livros do Tanakh (a bíblia hebraica) já deviam estar completas. O cruzamento das informações fornecida por Beroso com aquelas que contam da bíblia hebraica apontou impossíveis coincidências de narrativas, as quais provam que a historiografia dos israelitas copiou e adaptou muitas narrativas dos povos da Assíria-Babilônia. Apenas fragmentos dos livros de Beroso sobreviveram, e um possível motivo disso é terem sido queimados nas fogueiras de livros promovidas pelos bispos da cristandade, que pregavam a origem divina da Bíblia.

Sabemos da existência dos livros de Beroso através das citações de Eusébio de Cesária e de Josephus. No seu primeiro livro, Beroso descreveu a terra da Babilônia, cuja civilização foi levada para lpa pela divindade Oannes, que era metade homem e metade peixe, bem como por outras divindades, incluindo ainda a lenda da criação e a sua versão da astrologia caldeia. Nesse livro, Beroso afirma que Oannes é considerado o autor da ‘cosmogonia’ babilônica, o livro que descreve a criação do mundo, e cita diversos trechos do mesmo. O segundo e o terceiro livros fornecem uma cronologia da história da Babilônia e da sucedânea Assíria, que começa com ‘os dez reis anteriores ao dilúvio’, passando à narrativa do dilúvio e a restauração da monarquia, com uma longa série de monarcas que reinaram ‘depois do dilúvio’,  as ‘cinco dinastias’, finalmente a história mais recente dos assírios, o último reino da Babilônia, a invasão persa e a conquista de Alexandre da Macedônia.

Sobre a historiografia dos israelitas, esta é a mesma que os povos cristãos designaram como ‘Bíblia’. Antes de prosseguir, é mister relembrar que o nome ‘Bíblia’ só passou a ser usado para designar os livros sagrados dos israelitas, depois que estes foram traduzidos para o grego e consolidados na versão designada como ‘Septuaginta’, cuja compleição é estimada em cerca de dois séculos após a compleição da obra em hebraico.

Segundo a informação arqueológica existente – a arqueologia bíblica – , a bíblia só começou a ser escrita no segundo século a.C., ou seja, cerca de 400 anos depois do exílio dos israelitas na corte de Nabucodonosor II da Babilônia. Os textos bíblicos foram escritos em hebraico, e, por diversos autores. O Pentateuco, que se refere aos primeiros cinco livros da bíblia, têm quatro fontes assim designadas: J (Javé), E (Elói), D (Deuteronômio) e P (Padres). O primeiro livro, Gênese ou Bereshit em hebraico , narra as bem conhecidas histórias da Criação, do Jardim do Éden, de Caim e Abel, Noá e o Dilúvio, a Torre de Babel, e como os israelitas foram para o Egito. O segundo  livro, Êxodus, narra como os israelitas conseguiram sair do Egito onde eram escravos, incluindo a história de Moisés. Todas essas histórias possuem correspondentes bem mais antigos na historiografia da Babilônia e da Assíria, conforme Beroso gravou em sua obra. A decifração da escrita cuneiforme em meados do século XIX  trouxe à tona as mesmas histórias gravadas em tabletes de barro. Isso é um exemplo clássico do cruzamento de fontes de informação a fim de enriquecer a História.

Post Script.

Tal é a correspondência entre as histórias da bíblia e a historiografia da Assíria-Babilônia que essas não podem ser consideradas coincidências aleatórias. Os eruditos cristãos possivelmente já sabem disso e já entendem a Bíblia como uma espécie de destilado da sabedoria humana. Entretanto, tais fatos são desconhecidos pela maioria das pessoas, e uma parcela significativa da população não consegue viver sem religião e suas narrativas fabulosas. A pergunta que muitos eruditos cristãos certamente já fazem é sobre o que fazer com as estruturas religiosas já montadas. Uma alternativa que os clérigos têm é promover o humanismo em suas congregações, deixando de lado as cobranças acerca de crenças. Eventualmente as igrejas existentes ganharão novas finalidades, transformando-se em escolas ou centros comunitários.

História, pré-história e historiografia

A história como uma narrativa elaborada dos eventos públicos baseada em pesquisa, surgiu na Grécia mais ou menos entre 450 e 430 a.C., a partir de Heródoto de Alicarnasso, considerado o pai da história. Heródoto deixou as primeiras crônicas sobre o Egito – a primeira civilização a deixar registros escritos –, bem como sobre a Babilônia, a Assíria e a Pérsia. Heródoto escreveu o livro Historias,  pelo qual foi reconhecido como o pai da história. Entretanto, a definição de história que prevaleceu é aquela baseada em sistemas de evidências intercruzadas, envolvendo testemunhos escritos e artefatos arqueológicos. Outros historiadores que vieram depois de Heródoto reconheceram  que muitas das narrativas no livro Historias eram ficcionais. Os eruditos modernos sugerem que a tradução mais correta do título do livro de Heródoto seria ‘Inquirições’.

A pré-historia é outro termo cuja definição evoluiu ao longo do tempo. Heródoto entendia que apenas as obras escritas serviam como registro da história, e assim sendo, o termo pré-história era entendido como o período que antecedeu o surgimento da escrita. Entretanto, o mero fato de colocar uma narrativa no papel não significa que tal narrativa seja verdade. Uma das maneiras que os historiadores encontraram de assegurar a verdade é através do intercruzamento de informações. A grande consequência disso é que o limite entre a história e a pré-história desapareceu. As historiografias, ou relatos históricos, só fazem parte da história quando apoiadas em evidências intercruzadas.

On the mission of conserving the Amazon and its constraints

Joaquina Pires-O`Brien

Amazon Conservation Handbook. Foreword

Since the 1980s the importance of  Amazonia in the global environment and its future has ceased to be a problem of a restricted circle of conservationists and gained public support worldwide.  Environmental organizations of local, national and international influence have sprouted throughout the Western societies, many of   which specifically dedicated to save the Amazon rain  forest. New magazines and newspapers specializing in green issues have came into existence, and the traditional ones have added special sections on the environment. Before the 1980s, conservation campaigns had to rely on the appeal which certain animal species had upon human beings. Now public awareness has matured to a point of supporting the conservation of the Amazon forest by itself, and the focus is now on the biodiversity of both animals and plants.

Amazonia is the last great extension of primary forest in the world. It is a repository of species and genes so rich that many such species and genes are thought to become extinct before we even register their existence. Tribes of Indians, many of which still living on their traditional ways, depend directly on the forest for survival. Amazon is burning! In 1988 the alarm soared in every major city in the world. Satellite photos revealed that the rate of deforestation had jumped to unacceptable levels. This horrendous marathon of destruction was led by Brazil, with a deforestation rate estimated in 50,000 square kilometers per year. There has been a public recognition that the Amazon conservation trespasses the frontiers of the Amazon countries. However, attempts to provide the Amazon countries with foreign-originated solutions have sometimes driven their governments to withdraw from the environmental debate.

Although  the people of  Brazil and of  other Amazon countries may share the same values of conservation with people from the developed countries, their perspectives are different. Most Amazon countries are facing tremendous economic problems such as hyperinflation and large foreign debts. Brazil has not seen real economic growth in over ten years, although during this period its population increased from 121 to 150 million. Its trade surplus, considered among the highest in the world, is all used up to pay interest on the debt. Only when considering the problems that the Amazon countries are facing can an outsider begin to understand why the development of the vast uninhabited area of the Amazon is seen by these countries as a solution to their economic difficulties. The understanding of the environmental problems of Latin America, including the conservation of Amazonia, is only possible in the context of the causes and effects of the developmental policies of each country.

The impact of economical development of the countries which envelop the Amazon biome has been less significant than that caused by Brazil, something that is largely attributed to existing geographical barriers such as the Andes, which separate their developed and most populated regions from the forest. Brazil detains 63.4% of the total Amazon biome, and the latter is continuous with its most developed areas. This particular circumstance explains why Brazil`s economic development policies have the greatest impact on the Amazon. This is also the reason why most information provided in Chapter 2 refers to Brazil.

This report represents the result of a 50-day consultancy, commissioned by the WCMC Programme and Technical Advisory Committee. Its purpose was to review the information holdings on Amazonia as a first step towards the development of a distributed network in the region. Although there is a large literature on the Amazon, the amount of time available to prepare this Report has limited substantially the depth of the discussions. To compensate for this, an attempt was made to point out the existing review articles and other sources of specialized information, in which the reader could pursue more detailed information. The major part of the report deals specifically with nature conservation topics such as species, protected areas and critical sites. However, topics which are more economically related such as major development projects and population growth were also included, since they are intimately attached to conservation problems. There is also a chapter on the Physical Setting of Amazonia, which relates to both conservation and economic development. Finally, a list of the organizations working on Amazonia at both the regional and the international level is provided in Chapter 8. Although only a brief sketch on the subject was possible, the combined aspects of development and conservation assembled in this report will prove useful for a better understanding of the problems of Amazonia.

Maria Joaquina Pires

April 1990

Notes.

(1) Dr Joaquina Pires-O`Brien is a former botanist and forest ecologist from Brazil. After moving to the UK in 1995 she did some environmental consultancy work but eventually left botany and ecology to start a new career as a translator. From 2010 to 2020 she edited PortVitoria, an electronic magazine centered on the Iberian culture, written in English, Portuguese and Spanish. She also keeps four blogs including the present one.

(2) The text presented above is a revised version of that particular section, extracted from the report that she prepared in April 1990 for the World Conservation Monitoring Centre (WCMC),  Huntington, UK, which today is incorporated inside United Nations as UNEP-WCMC.

(3) Full reference: Pires, M J. Amazon Conservation Handbook. A Report to WCMC. 27.06.1990, 148 pp. You can request a PDF copy by clicking like or by sending an email to jopiresobrien@gmail.com

On the mission of conserving the Amazon and its constraints

Joaquina Pires-O`Brien

Amazon Conservation Handbook. Foreword

Since the 1980s the importance of  Amazonia in the global environment and its future has ceased to be a problem of a restricted circle of conservationists and gained public support worldwide.  Environmental organizations of local, national and international influence have sprouted throughout the Western societies, many of   which specifically dedicated to save the Amazon rain  forest. New magazines and newspapers specializing in green issues have came into existence, and the traditional ones have added special sections on the environment. Before the 1980s, conservation campaigns had to rely on the appeal which certain animal species had upon human beings. Now public awareness has matured to a point of supporting the conservation of the Amazon forest by itself, and the focus is now on the biodiversity of both animals and plants.

Amazonia is the last great extension of primary forest in the world. It is a repository of species and genes so rich that many such species and genes are thought to become extinct before we even register their existence. Tribes of Indians, many of which still living on their traditional ways, depend directly on the forest for survival. Amazon is burning! In 1988 the alarm soared in every major city in the world. Satellite photos revealed that the rate of deforestation had jumped to unacceptable levels. This horrendous marathon of destruction was led by Brazil, with a deforestation rate estimated in 50,000 square kilometers per year. There has been a public recognition that the Amazon conservation trespasses the frontiers of the Amazon countries. However, attempts to provide the Amazon countries with foreign-originated solutions have sometimes driven their governments to withdraw from the environmental debate.

Although  the people of  Brazil and of  other Amazon countries may share the same values of conservation with people from the developed countries, their perspectives are different. Most Amazon countries are facing tremendous economic problems such as hyperinflation and large foreign debts. Brazil has not seen real economic growth in over ten years, although during this period its population increased from 121 to 150 million. Its trade surplus, considered among the highest in the world, is all used up to pay interest on the debt. Only when considering the problems that the Amazon countries are facing can an outsider begin to understand why the development of the vast uninhabited area of the Amazon is seen by these countries as a solution to their economic difficulties. The understanding of the environmental problems of Latin America, including the conservation of Amazonia, is only possible in the context of the causes and effects of the developmental policies of each country.

The impact of economical development of the countries which envelop the Amazon biome has been less significant than that caused by Brazil, something that is largely attributed to existing geographical barriers such as the Andes, which separate their developed and most populated regions from the forest. Brazil detains 63.4% of the total Amazon biome, and the latter is continuous with its most developed areas. This particular circumstance explains why Brazil`s economic development policies have the greatest impact on the Amazon. This is also the reason why most information provided in Chapter 2 refers to Brazil.

This report represents the result of a 50-day consultancy, commissioned by the WCMC Programme and Technical Advisory Committee. Its purpose was to review the information holdings on Amazonia as a first step towards the development of a distributed network in the region. Although there is a large literature on the Amazon, the amount of time available to prepare this Report has limited substantially the depth of the discussions. To compensate for this, an attempt was made to point out the existing review articles and other sources of specialized information, in which the reader could pursue more detailed information. The major part of the report deals specifically with nature conservation topics such as species, protected areas and critical sites. However, topics which are more economically related such as major development projects and population growth were also included, since they are intimately attached to conservation problems. There is also a chapter on the Physical Setting of Amazonia, which relates to both conservation and economic development. Finally, a list of the organizations working on Amazonia at both the regional and the international level is provided in Chapter 8. Although only a brief sketch on the subject was possible, the combined aspects of development and conservation assembled in this report will prove useful for a better understanding of the problems of Amazonia.

Maria Joaquina Pires

April 1990

Notes.

(1) Dr Joaquina Pires-O`Brien is a former botanist and forest ecologist from Brazil. After moving to the UK in 1995 she did some environmental consultancy work but eventually left botany and ecology to start a new career as a translator. From 2010 to 2020 she edited PortVitoria, an electronic magazine centered on the Iberian culture, written in English, Portuguese and Spanish. She also keeps four blogs including the present one.

(2) The text presented above is a revised version of that particular section, extracted from the report that she prepared in April 1990 for the World Conservation Monitoring Centre (WCMC),  Huntington, UK, which today is incorporated inside United Nations as UNEP-WCMC.

(3) Full reference: Pires, M J. Amazon Conservation Handbook. A Report to WCMC. 27.06.1990. You can request a PDF copy sending an email to jopiresobrien@gmail.com

Barão de Mauá (1813-1889). Brazil’s first self-made man

Joaquina Pires-O`Brien

The many new industrialist of the Gilded Age in America gave rise to the narrative that anyone can obtain financial success if they work hard enough. Although the idea of the self-made man is normally associated to the United States, Brazil had its own self-made man: Barão de Mauá, whose name at birth was Irineu Evangelista de Sousa (1813-1889).  He received the title of baron for building Brazil’s first railroad, a stretch of 14.5 Km (later stretched to 15.6 Km) connecting the center of Rio de Janeiro to Fragoso, on the hillside of Serra da Estrela, Petrópolis, where was the Summer house of the Emperor. He continued to be known as Barão de Mauá even after being made a viscount at a later time.

Just as the early industrial entrepreneurs in the United States were envied by the old upper-class,  Mauá too became the object of much envy, and was seen by old money as an arriviste or nouveau riche, and in addition to that, he was an abolitionist. It took nearly a century for Mauá to be recognised in Brazil as a brilliant entrepreneur and a self-made man. In the United States the era of rapid economic growth from the 1870s to about 1900 became known as the Guilded Age. The same era in Brazil is known as the Age of Mauá.

Mauá could have accomplished much more for himself and for Brazil. However, he was a stranger in the nest. Mauá’s idea that money was a fair reward for hard work and enterprise was anathema to Brazil’s landed gentry. Brazil was an agricultural economy relied on slave labour, and Mauá was an abolitionist.  There was a lot of court intrigue against him, not just by the old money but also by the politicians who had the Emperor’s ear. The latter could have given Mauá the support he deserved but chose to do nothing. In spite of being spurned by Brazilian society, Mauá was a respected name among the British bankers. Mauá was a giant among minions. His tremendous potential was unfulfilled, and the greatest loser was Brazilian society.

Chronology of Barão de Mauá

1813 (28 December): Irineu Evangelista de Sousa is born, in the village of Arroio Grande, Jaguarão, Rio Grande do Sul, near the border with Uruguay.

1819: His father, João Evangelista de Ávila e Sousa, a rancher, is killed by cattle thieves.

1820: Irineu learns to read and write, taught by his mother, Mariana de Jesus Batista de Carvalho, from whom he receives his first lessons in arithmetic.

1821: His widowed mother, Mariana de Jesus Batista de Carvalho, remarries, to João Jesus e Silva, who does not wish to maintain a relationship with the children from her previous marriage, and Irineu is placed with his uncle Manoel José de Carvalho.

1822: After his mother`s marriage, Irineu, then aged 9, goes on a trip to Rio de Janeiro with another uncle, José Batista de Carvalho, a ship’s capitain.

1824: He works as a salesman in a haberdashary owned by a Portuguese man called Antônio Pereira de Almeida.

1828: At age 15, he stars to work book-keeper for the same shop.

1829: Due to the bankruptcy of Antônio Pereira de Almeida and the closing of the haberdashery,  Irineu goes to work at Carruthers & Cia, an importer company owned by a Richard Carruthers, a Scot.

1836: He becomes the manager of Carruthers & Cia.

1837: He becomes a partner of Carruthers & Cia after Richard Carruthers returns to England.

1839: Irineu’s sister, Guilhermina, who lived in Rio Grande do Sul, comes to Rio to live with him,  brining her daughter Maria Joaquina de Sousa, known as ‘May’.

1840: Irineu travels to England for the first time, on business, and there he becames acquainted with the new inventions of the Industrial Revolution and with the capitalist system.

1841: Irineu marries his niece `May`, and the couple has eleven children (who survived birth).

1844: Carruthers & Cia faces financial difficulties due to an increase in the importation duty imposed by a piece of legislation called `Lei Alves Branco’.

1845: Irineu liquidates the company Carruthers & Cia.

1846: He starts the Ponta da Areia Foundry and Shipyards company, to manufacture boilers and ships, considered to be Brazil`s most important industry.

1849–1850: With ships built at Ponta da Areia, he started the tag boat company called `Companhia de Rebocadores Barra do Rio Grande`.

1850: He provided the pipes for the waterworks of Rio de Janeiro, which used the water from the  Maracanã river.

1851: He founded the Gas Lighting Company of Rio de Janeiro, whose control he maintained until 1855. He founded Brazil’s second bank.

1852: He founded the following companies: Amazonas Steam Navigation (based on a 30 year exploration contract), the Fluminense Transport Company and the Petrópolis Railway Company (Brazil`s first railway, from Porto Estrela, in Guia de Pacobaíba, Magé, until Petrópolis).

1853: Becomes one of the major investors of the Recife & São Francisco Railway Co. and the Bahia & São Francisco Railway Co.

1854 (25 March): The first gas lamps are lit in Rio de Janeiro.

1854 (30 Abril): In the presence of Dom Pedro II, Brazil`s emperror, and various authorities,  he inaugurated the first part of the Petrópolis Railway, a stretch of 14.5 km between the Port of Mauá, on the bay of Guanabara, and the Fragoso station, at the foot of Serra da Estrela (Petrópolis), in the Province of  Rio de Janeiro. Dom Pedro II gives him the title of Barão de Mauá.

1855–1856: He enters politics and becomes a supply ‘Deputado’ (Representative). He established a worker’s  agriculture colony (commune) on the Province of Amazonas, and started negotiations with investors to build a railway from Santos to Jundiaí, in the Province of São Paulo.

1855: (30 April) Together with 182 investors he created the a Mauá, MacGregor & Cia, a finance institution, which had representations in several Brazilian capital cities, as well as in London, Paris, New York, Buenos Aires and Montevideo.

1856: He invested in the Tijuca railway, which went bankrupt in 1868.

1857: He was elected ‘deputado’ (Representative). The industrial plant at Ponta da Areia sis destroyed by arson.

1858: He inaugurated the Dom Pedro II Railway (later renamed ‘Central do Brasil`).

1860 (3 December): He introduced a legislation (Tarifa Silva Ferraz) that reduced the importation duty  on machinery, tools and ironworks.

1861 (6 May): He purchased two ranches (Caguassu and Capuava) from Capitain João José Barbosa Ortiz and his sisters Escolástica Joaquina e Catharina Maria, for 22,500 contos de réis. The properties, in Pilar, in the pParish of São Bernardo, externded from Santo André until Rio Grande da Serra. The properties main house was demolished in 1974, for the building of a viaduct on the road between Petrópolis and Rio de Janeiro.

1862: He obtained a concession to exploit the transport by trams in Rio de Janeiro. The rights of this company were transferred to the American company Botanical Garden’s Railroad (1866), which inaugurated the first line,  between Jardim Botânico and Botafogo (1868).

1863: He sold his shares in the São Paulo Railway (later called Santos-Jundiaí Railway).

1867 (1 January): He founded the Bank Mauá & Cia., that succeeded the finance company Mauá, MacGregor & Cia.

1867 (4 de abril): He inaugurated the Santos-Jundiaí Railway. This also marks the beginning of the downfall of Mauá’s enterprises.

1871: He invested in the Paraná Railway.

1872: He initiated two agricultural colonies on the Provincia of Rio de Janeiro. He inaugurated the  arrival of the transatlantic cable in Brazil.

1874: He organized the Rio de Janeiro Watter Supply Company, which operated until 1877.

1874 (26 de June): He was awarded the title of Viscount by Brazil`s Emperor Dom Pedro II.

1875: He applied to the Commerce Tribunal for a three year moratorium on his debts.

1877: He closed down the Ponta da Areia Welding and Shipyard company.

1878: He published the article `O meio circulante do Brasil`(Brazil’s circulating environment). He closed down the Mauá Bank.

1879: He wrote and published the book `Exposição aos credores e ao público’ (An explanation to creditors and the public), explaing the reasons of his moratorium and the financial difficulties that brought down his major enterprises. This included a brief autobiography.

1882: The Petrópolis Railway inaugurated its new extension to the city of Petrópolis.

1883: He travelled to London in na attempt to find a solution to his financial problems.

1884 (26 November): At age 70, after having payed his his ceditors, he received his letter of rehabilitation as a businessman, and starts to work as a commodities broker, especially coffee. He moved from Rioi to Petrópolis.

1889 (21 October): He died in Petrópolis, in the Province of Rio de Janeiro, a few days before the Proclamation of the Republic.

***

A noção de excelência na História

Joaquina Pires-O’Brien

A história do Ocidente mostra que a noção de excelência já existia nas antigas sociedades gregas e romanas, sendo representada pela palavra grega areté (ἀρετή) e pela palavra latina excelentia. Tanto os sábios gregos quanto os sábios latinos aprenderam a distinguir entre a verdadeira excelência e a glória. Na antiguidade grega clássica, a palavra  ‘kratos’, que significa ‘governo’ foi juntada à palavra  areté  para formar o termo ‘aristocracia’, que descrevia o  ‘governo dos excelentes’. Quando Sócrates mostrou que a excelência não era necessariamente atrelada à fama, isso irritou bastante o ‘hoi polloi’, inclusive os 500 membros do júri que o condenou à morte.

No mundo contemporâneo há uma presunção de que os cidadãos eleitos para cargos governamentais são os mais valorosos da sociedade, razão pela qual são tratados de ‘excelência’.  Atualmente, ninguém em sã consciência imagina a democracia como sendo o governo dos menos capazes. Entretanto, uma parcela significativa do eleitorado é tão ignorante que ignora até a própria ignorância. O despreparo desses eleitores faz com que somente consigam imaginar o valor quando este é acompanhado da fama.

Os sábios da antiguidade clássica não apenas aprenderam a separar a excelência da fama mas também a apreciar a relação direta que existe entre a excelência a meritocracia. Já a sociedade contemporânea, esta despreza a meritocracia pois não consegue distinguir entre o verdadeiro e o falso mérito. Este curto ensaio procura mostrar que a sociedade contemporânea perdeu a capacidade de distinguir entre a excelência e a glória, esta última representada pela fama e pelo sucesso nas redes sociais.

A tradição grega

A tradição grega acerca da excelência está contida nas obras de Homero, que conta a história de indivíduos cujas realizações são veneradas na poesia. Na Ilíada, Aquiles é descrito como o melhor guerreiro que já existiu, sendo ainda dotado de grande inteligência para imaginar estratagemas eficazes. Aquiles é tudo isso porque possui ‘areté’, isto é a excelência. Aquiles conta como a sua mãe lhe havia assegurado que a sua fama seria eterna, pois ele ganharia um ‘kleos’ imperecível. Aqui, a palavra ‘kleos’ significa reconhecimento, fama ou glória. A fama eterna de Aquiles não é sem razão, como mostra a narrativa homérica.

Na tradição grega a excelência é acompanhada da fama. Em Atenas, o tipo de excelência mais reconhecido era a do esporte, seguida do teatro, enquanto que em Esparta era a militar.

Sócrates (c. 470 – 399 AEC) e Platão (427 – 347 AEC) deram uma nova interpretação à palavra ‘areté’. Tanto como registrador do pensamento de Sócrates quanto como pensador por si próprio, Platão afirmou que a filosofia serve de guia para a vida que vale a pena, e ao ensinar a vida que vale a pena, ele apontou a importância de cada qual buscar o melhor de si próprio mesmo sem haver uma possibilidade de ser recompensado por isso. O areté passa a ser o valor de cada pessoa, o qual existe em medidas diversas, independentemente de ser socialmente reconhecido ou não. Ou seja, o areté – excelência –, não é mais ligado ao kleos – fama ou glória–, sendo simplesmente o caráter do indivíduo.

Sócrates afirmou que o caráter de cada pessoa é um projeto de vida que só termina com a morte. O indivíduo que possui o hábito de refletir não apenas sabe distinguir o certo do errado mas também conhece a si próprio; portanto, sabe que o seu próprio caráter é diminuído ao fazer algo que não deve, mesmo que ninguém tenha percebido o mal que fez. Reconhecendo que o cometimento de um ato diminuiria o seu próprio caráter, Sócrates recusou a ajuda para fugir de Atenas antes de sua execução, e no seu julgamento, afirmou preferir ser injustiçado do que cometer uma injustiça.

A tradição romana

A tradição romana acerca da excelência é parecida com a tradição grega, pois mistura as ideias de excelentia – excelência – e de glória. Marcus Túlio Cícero fez a mesma coisa que Platão e Sócrates, e separou a excelência da glória, quando reconheceu que embora fazer parte do senado romano era uma coisa gloriosa, essa glória nem sempre vinha acompanhada da excelência. Pensando nisso, Cícero separou os senadores romanos em duas categorias, os bons e os populistas, que ele chamou de optimates e populares. Os optimates eram em geral conservadores, que desejavam preservar as tradições da república como o status quo, os direitos de propriedade e o prestígio do senado. Os populares não tinham uma política fixa pois as suas ações eram planejadas para agradar às massas e ganhar o seu suporte a fim de aumentar suas chances de permanecer no poder.

A primeira visa parece que os optimates são os melhores em tudo e os populares os piores, mas é provável que ambos grupos tinham suas faltas. A maior falta dos optimates foi ter tramado e levado a cabo o assassinato de Júlio César, julgando que faziam isso para salvar a república. Como a popularidade de Júlio César era bastante grande, o povo demandou a apuração de culpados, iniciando a crise que pôs fim à república e implantou o império.

A excelência na sociedade contemporânea

O reconhecimento das pessoas excelentes é uma condição necessária para o bom andamento da sociedade, e, cada sociedade tem seus benchmarks de excelência, bem como diferentes regras ou interpretações daquilo que tem mérito, e que, por ter mérito, merece recompensa. A Idade Digital e as redes sociais que a caracteriza tem reforçado a noção errônea da igualdade das pessoas e não o reconhecimento das pessoas excelentes.  A consequência disso é o  considerável rebaixamento dos benchmarks tradicionais, sendo que uma boa parte da população perdeu a capacidade de distinguir entre a verdadeira autoridade, aquela que é necessária e desejável para o bem-estar da sociedade e para a proliferação do conhecimento, e, a falsa autoridade dos indivíduos que se inflaram através da sedução das massas nas redes sociais. Isso possivelmente explica o desprezo da sociedade contemporânea pela meritocracia, ao contrário do que os sábios do mundo clássico pregavam.

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